Enviar dinheiro, ao exterior, mediante compensações financeiras, pode caracterizar o crime de evasão de divisas.
A remessa de valores, ao exterior, por meio de sistema de compensação ilegal, conceitualmente conhecido como dólar-cabo, é crime previsto na primeira parte, do parágrafo único, do art. 22, da lei 7.492/86:
Art. 22. Efetuar operação de câmbio não autorizada, com o fim de promover evasão de divisas do País:
Pena – Reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa.
Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem, a qualquer título, promove, sem autorização legal, a saída de moeda ou divisa para o exterior, ou nele mantiver depósitos não declarados à repartição federal competente.
Trata-se de infração penal que não exige muita sofisticação para a sua consumação, na medida em que pode ser praticada por qualquer meio de remessa, ao exterior, de valores não declarados à repartição federal competente.
Esse tipo de delito não se confunde com o crime tributário, pois, ao contrário deste (do crime fiscal) – que, em regra, exige lançamento fiscal definitivo superior a R$ 20.000,00 (vinte mil reais) -, o crime de evasão de divisas estará caracterizado, independentemente do valor remetido, ao exterior, de forma ilícita.
“Comete o delito tipificado no art. 22, parágrafo único, primeira parte, da Lei n. 7.492/1986, aquele que efetua operações de câmbio não autorizadas e promove, sem autorização legal, a evasão de divisas do País, independentemente do valor, dado não carecer o referido tipo penal de complementação por ato regulamentar.”
(APn 970/DF, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, Corte Especial, julgado em 4/5/22, DJe de 20/6/22.)
O delito em análise pode ser praticado de forma fictícia, por meio de compensações entre valores, como ocorre, por exemplo, quando o sujeito tem domicilio fiscal no Brasil e precisa pagar uma fatura no exterior. Ele se utiliza de interposta pessoa, para que seja feita uma compensação entre faturas de diferentes países.
“O delito de evasão de divisas, previsto no art. 22, parágrafo único, da lei 7.492/86, pode ser praticado não só mediante a efetiva saída do território nacional de pessoa que deixe de declarar às autoridades moeda ou divisa como também mediante técnicas mais elaboradas e complexas como o sistema de remessas de valores por meio de compensações, o que é conhecido como operação dólar-cabo ou euro-cabo. (AgRg no REsp 1.463.883/PR, relator Ministro João Otávio de Noronha, Quinta Turma, julgado em 17/8/21, DJe de 20/8/21.)”
Por mais ingênuo que possa parecer, a entrega de moeda estrangeira fora do território brasileiro, em contrapartida a prévio pagamento de reais no Brasil, pode caracterizar o crime previsto no art. 22, parágrafo único, da lei 7.492/86:
“A condenação do agravante foi justificada pelo Tribunal de origem com base nas conversas interceptadas e documentos apreendidos, bem como na sua admissão de ter emprestado dinheiro em reais e recebido no exterior em dólares, a configurar a prática de “dólar-cabo”.” AgRg no REsp n. 1.905.931/SP, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 10/8/21, DJe de 16/8/21
Aliás, como o dólar-cabo pode ser praticado de forma livre, a sua consumação independe de prévio regulamento de autoridade federal que discipline a matéria:
“No que tange à alegação de que o art. 22, parágrafo único (primeira configuração), da lei 7.492/86, constitui norma penal em branco, também não assiste razão ao agravante. Com efeito, essa Corte Superior de Justiça já decidiu que “para a caracterização do tipo penal em questão, não se exige complementação por meio de regulamentação do órgão federal competente, mas, sim, a transferência, transporte ou remessa física de moeda ou recursos para o exterior por meio de transações financeiras realizadas sem autorização legal, independentemente do valor, visando, com isso, à proteção da política cambial brasileira” (AgRg no REsp 1.849.140/RS, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 1º/9/20, DJe 9/9/2020). AgRg no AREsp 1.683.234/PR, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 23/3/21, DJe de 29/3/21″
Portanto, de acordo com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, comete o crime previsto na primeira parte, do parágrafo único, do art. 22, da lei 7.492/86, com pena de reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa, quem envia, ao exterior, ainda que de forma fictícia, valores que deveriam ser previamente controlados pelas autoridades governamentais brasileiras.